Existem os produtos e existem os seus usuários. Se são muitos e fiéis, acabam por desenvolver uma cultura do consumo. Apreciam a bebida, instituem rituais de socialização onde não pode faltar a cerveja, marcam os momentos de suas vidas pelo convívio com outros apreciadores da bebida. O consumo permite isso: criar laços entre indivíduos distintos a partir de um gosto comum. Sendo o consumo de algo associado ao lazer, prazer, tanto mais intensa será a preferência e a adesão à idéia.
Veja-se ao lado que a Brahma, lá por 1908, precisou contratar um médico, auto-denominado higienista, para combater os outros médicos higienistas e afirmar que a cerveja fabricada aqui atendia às restrições dos médicos temperantes, críticos do consumo de álcool. Iniciativas como a do folheto de 1908, muito lobby junto aos parlamentares e propaganda salvaram a imagem da cerveja como produto que se pode consumir sem culpa: nem álcool é, diziam! Ninguém saiu em defesa da aguardente que apanhou feio da propaganda temperante.
Abaixo, segue artigo sobre o lançamento da cerveja Brahma Chopp, em 1933, já em outro momento de crise. A ameaça ideológica contra a legitimidade de cerveja já havia passado, aliás, as cervejarias brasileiras superaram a crítica temperante com folga. O problema em 1933 era a recessão dura que encolheu o mercado consumidor. Com todo mundo sem dinheiro para passar horas em bares e pagar a conta, os marketeiros da Brahma inventaram uma forma de chope que se pode tomar em casa. Claro que não existe chopp engarrafado, o pessoal sabia bem disso. E daí? Os consumidores quiseram acreditar que, ao comprar uma cerveja pasteurizada tipo pilsner, bem aguada, estavam na verdade comprando o chopp que costumavam beber fora de casa. Assim, a cerveja invadiu o espaço do lar e se instalou para não mais sair.